Um trágico fim de semana para a música eletrônica

Publicado em 18/10/2012 - Por

Existe um provérbio chinês que diz: “Espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier.” Talvez essa tenha sido a maior lição a se tirar do triste episódio envolvendo o festival Mundo Imaginário, que aconteceu entre os dias 12 e 14 de outubro em São Tomé das Letras, interior de Minas Gerais.

Tudo parecia correr bem até a véspera do evento que, segundo informações, deveria reunir cerca de 5 a 6 mil pessoas para 3 dias de celebração de paz, amor e psicodelia. No entanto, o que se viu desde a chegada na portaria até os tristes eventos que aconteceram na sequência, foi uma grande tragédia, sob qualquer ângulo que se analise. Não bastasse o enorme despreparo dos organizadores do evento, uma terrível fatalidade marcou o festival.

Camping em local totalmente desprotegido.

 

A fatalidade foi um raio ter caído sobre uma das barracas do camping, enquanto o carioca Flávio Muniz de Abreu, de 23 anos, estava dentro, protegendo-se do mau tempo. Ele ainda foi socorrido por uma ambulância, mas não resistiu. Após a morte do rapaz, muitos cobraram a existência de pára-raios na área do evento. Eles teriam evitado a tragédia? Talvez. Mas não me consta que esse tipo de estrutura seja uma exigência para a realização desse tipo de evento (corrijam-me se eu estiver erado). Infelizmente resta-nos lamentar e, à organização do evento, prestar toda a assistência à família. É o mínimo que se espera.

Mas se não podemos culpar o Mundo Imaginário pela morte de Flávio, existem outros inúmeros problemas que claramente ocorreram pela desorganização dos envolvidos. Da área de camping situada em um local aberto e desprotegido, passando pela falta de banheiros, comida, bebidas, etc, até outros problemas relacionados à estrutura em geral. Segundo relatos de diversas pessoas que estiveram por lá, mesmo alguns palcos montados não chegaram a funcionar.

Banheiros imaginários

 

No entanto, o que pareceu deixar o público mais revoltado foi a ausência de qualquer responsável pelo evento em seus piores momentos. Após a chuva que castigou a região, o caos se instaurou e a polícia precisou ser chamada. Segundo o portal R7 noticiou ainda no sábado, “Os organizadores do evento não foram encontrados pela PM. Os militares descobriram que eles voltaram para São Paulo depois da tragédia. Policiais estão no local para conter o público, que reclama da falta de comida.

Quanto aos seguranças, se existiam, estavam ocupados com alguma outra coisa, enquanto aconteciam bizarrices como essa:

Enquanto parte do público agia como verdadeiros animais saqueando a carga do caminhão, alguém tentou contê-los usando uma motoserra. Imaginem a proporção da tragédia se esse sujeito realmente conseguisse atingir alguém.

É fácil imaginar que estavam todos revoltados, talvez até com fome e sede, mas NADA justifica esse tipo de atitude. Já vi cenas de populações carentes, privadas de água, comida e outros recursos básicos comportando-se de maneira muito mais civilizada ao receber ajuda humanitária. Além do mais, o caminhão e sua carga eram propriedade de um fornecedor do evento, que nada tinha a ver com os problemas ocorridos até então e, provavelmente, ainda nem havia recebido por seus produtos.

Como se não bastasse, segundo relatos, algum outro bando de imbecis passou a saquear barracas e o que mais encontravam pela frente, incluindo equipamentos e pertences de terceiros, que foram curtir ou trabalhar no festival. Prova de que quando o bicho pega, o “P.L.U.R” é o primeiro a ir por água abaixo.

Se o evento não ocorreu como o esperado, fotografe, filme, registre todos os problemas, e vá para casa procurar seus direitos no dia seguinte. Prejudicar um númaro ainda maior de pessoas não ajudará em nada.

 

Passado o caos, evento encerrado, era óbvio que o público e seus familiares fossem buscar informações na internet. Especialmente porque a morte de Flávio fora noticiada já no sábado(13) em vários portais de notícias, mas muita gente só encontrava (e repetia) informações desencontradas no Facebook. Quem estava de fora, por muitas horas, só sabia que “alguém havia morrido em uma festa rave em Minas Gerais”.

E então chegamos à parte final do problema: a organização, que se mostrou ineficiente no local do evento, também sumiu na internet. Por dias ninguém se pronunciou.

Antes da tragédia, “somos um núcleo sério”. Depois, ninguém faz parte de nada.

 

Cansados de reclamar na fanpage do evento e não obter nenhuma resposta, o público acabou criando um grupo específico (O Mundo Imaginário – O Festival das Decepções) para, por conta própria, tentar organizar as informações sobre o ocorrido. Outras pessoas aproveitaram para esclarecer que tiveram seus nomes/marcas envolvidos sem autorização, como os organizadores da Respect e Mundo de Oz:

Apenas ontem, dia 17 de outubro, CINCO dias após o início do festival, soltaram uma nota oficial que, sinceramente, é um verdadeiro deboche com todos os envolvidos. Se você quiser se indignar um pouco mais, basta ler aqui.

É óbvio que ninguém realiza um evento querendo que ele aconteça “de qualquer jeito”. Eu prefiro imaginar, nesse caso, que a tragédia tenha sido provocada por uma sequência de falhas somadas à inexperiência de seus organizadores.

No final de tudo, o mais provável é que os responsáveis pelo evento sofram alguns processos, arquem com um enorme prejuízo e, com sorte, desistam de organizar qualquer coisa que envolva mais do que 10 ou 20 pessoas.

Talvez este tenha sido o episódio mais triste da música eletrônica nos últimos tempos, mas que não deve jamais ser esquecido. Todos os que frequentam e organizam festivais, ou mesmo os que pretendem realizar uma simples “PVT para os amigos” no próximo fim de semana devem sempre ter em mente de que um evento, de qualquer porte, é coisa séria. São vidas que estão sendo confiadas a você, no momento em que o público sai de casa e percorre quilômetros de estradas de chão, madrugada a dentro, procurando um pouco de diversão.

Jamais brinque com isso.

 

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